quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Próxima Sessão - 27 de Novembro 2012

Tema - LUZ




Responsável pela sessão - Mila 




terça-feira, 20 de novembro de 2012

IMAGEM

Sessão de 13 de Novembro de 2012

Carmen, leu: de Cristina Carvalho - Lusco Fusco






A FADA DA VISÃO
In Lusco-fusco, Cristina Carvalho

A fada da visão
ofereceu-me a luz e a cor.
Houve um dia que eu te vi, Viktor e achei que eras bonito. Bonito e diferente de mim. Estavas à beira da lagoa. Pequenas libélulas transparentes, esverdeadas, azuladas, roxas, rosadas sobrevoam aos ziguezagues e poisam nas pedras húmidas das margens, escondendo-se no emaranhado dos canaviais e revolteando por cima das águas, para trás e para a frente atapetando o ar, polvilhando-o com os seus corpinhos finos, esguios e delicados.
Moramos quase no mesmo sítio, naquele descampado ali ao longe. Eu sei de ti e tu sabes de mim. Mas éramos muito pequenos quando nos vimos pela primeira vez. Os tempos passaram – não digo os anos passaram porque nós não temos anos nem idades, não temos nada, não somos nada nem ninguém… por isso, apareceste um dia ao fundo da floresta, figura que se podia confundir com um tronco de árvore, acastanhado, coberto de pó de terra, os cabelos lisos, brilhantes, os teus olhos falam para mim, olham-me, lêem os meus sonhos e tu, Viktor, aí estás a caminhar lentamente pelo carreiro da floresta e eu a esperar-te aqui no extremo da luz que vem nem sei de onde, um túnel de luz que varre, com a sua língua irisada de todos os tons da terra inteira, o ar que me envolve, o chão que suavemente piso e vens, aproximando-te rapidamente até que me alcanças a mim, que estou aqui parada há tempos e tempos sem fim. À tua espera.
Abraçamo-nos finalmente. Os nossos corpos sem espessura nem matéria confundem-se num só, o meu cabelo ruivo espalha-se pelos teus ombros, pelo teu rosto, pelo teu corpo e envolve-te completamente. Tu sentes o meu cheiro, percebes o meu sabor, deixas-te admirar, deslumbrar sem perceber muito bem o que te está a acontecer. Eu tento mexer em ti, festejar-te, alcançar as tuas cavernas inalcançáveis, secretas, deixa-me mexer em ti, afagar-te, explorar o teu corpo que existe e não existe, que eu conheço e não conheço. Se me deixares observar-te, Viktor, posso garantir-te que tudo será mais fácil entre nós. No desconhecimento dos corpos existe impureza, engano, desilusão.
Neste momento em que experimento conhecer-te, a fada da visão aparece. Dança à nossa frente, na penumbra de mistério que os nossos olhos fechados contêm. Experimentem fechar os olhos, de dia, num canto duma floresta, encostados a alguma árvore. Experimente! Há uma sombra qualquer, uma mancha que vai e vem, que dança mesmo à nossa frente sem nós a vermos, e que de repente se transforma num clarão inesperado, num raio de luz branca que nos pode cegar momentaneamente. São elas. São as fadas da visão. Essas manchas de luz que veem quando fechamos os olhos, por detrás do olhar, são as fadas da visão que nos visitam. Muitas vezes vemos as tais manchas a mexer-se, a aproximar-se, a afastar-se, manchas-clarão. São elas!
Se não fossem elas, se não fosse a sua presença, o meu olhar nunca te teria encontrado. Nunca teríamos a alegria de poder ver uma aurora, um crepúsculo, uma noite estrelada de verão ou de inverno, uma água, a cor duma planta, duma flor, a cor da Terra.
O que é que eu, Rocka, posso fazer ao olhar para uma fada-flor que se abre de repente, e da noite para o dia se alarga, entontece, que procura o meu olhar?
Nada. Não posso fazer nada a não ser olhar para ela. Simplesmente. E que o nosso olhar se procure e se entenda, que não sejam precisas as palavras porque tudo ficará a mais neste silêncio sublime.
Nem sequer tenho música dos pássaros para te oferecer. Hoje não tenho nada para te dar a não ser o que não quero dar, tudo o que me é proibido, afastado, longe, altíssimo como o voar de duas aves que se equilibram num espaço vazio e num cheiro qualquer. Pode ser o cheiro da floresta. Ou o cheiro do mar.
Gostei de ti, fada do olhar.




Vitória, leu: de Gonçalo Tocha, É Na Terra Não é Na Lua (excerto)






Rosa e Xana, leram Meditação n.º 14 (O ser e o parecer)




Vasco, leu: De William Shakespeare, Soneto 22 - Não Diga o Meu Espelho que Envelheço



Não diga o meu espelho que envelheço, 
se a juventude e tu têm igual data, 
mas se os sulcos do tempo em ti conheço 
então devo expiar no que me mata. 
Tanta beleza te recobre e deu 
tais galas a vestir a meu coração, 
que vive no teu peito e o teu no meu. 
Mais velho do que tu serei então? 
Portanto, meu amor, cuida de ti 
como eu, não por mim, por ti somente 
te cuido o coração, que guardo aqui 
como à criança a ama diligente. 
    Não contes com o teu se o meu morrer. 
    Deste-me o teu e o não vou devolver. 

Mila, leu de: Luigi Pirandello, Um, Ninguém e Cem Mil





Helena Amélia, leu de Charlie Chaplin - Necessito de um amigo; e de Oscar Wilde - Loucos e Santos
(Estes textos foram oferecidos aos quatro aniversariantes do mês de Outubro, pela Carmen.) 





- PRECISO DE ALGUÉM
Que me olhe nos olhos quando falo.
Que ouça as minhas tristezas e neuroses com paciência.
Preciso de alguém, que venha brigar ao meu lado sem precisar ser convocado; alguém Amigo o suficiente para dizer-me as verdades que não quero ouvir, mesmo sabendo que posso odia-lo por isso.
Neste mundo de céticos, preciso de alguém que creia, nesta coisa misteriosa, desacreditada, quase impossivel de encontrar: A Amizade.
Que teime em ser leal, simples e justo, que não vá embora se algum dia eu perder o meu ouro e não for mais a sensação da festa.
Preciso de um Amigo que receba com gratidão o meu auxílio, a minha mão estendida.
Mesmo que isto seja pouco para as suas necessidades.
Preciso de um Amigo que também seja companheiro, nas farras e pescarias, nas guerras e alegrias, e que no meio da tempestade, grite em coro comigo:
"Nós ainda vamos rir muito disso tudo"
Não pude escolher aqueles que me trouxeram ao mundo, mas posso escolher o meu Amigo.
E nessa busca empenho a minha própria alma, pois com uma Amizade Verdadeira, a vida se torna mais simples, mais rica e mais bela...

Charlie Chaplin

- Loucos e Santos

Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila.
Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.
A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos.
Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo.
Deles não quero resposta, quero meu avesso.
Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim.
Para isso, só sendo louco.
Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.
Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta.
Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria.
Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto.
Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade.
Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.
Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça.
Não quero amigos adultos nem chatos.
Quero-os metade infância e outra metade velhice!
Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa.
Tenho amigos para saber quem eu sou.
Pois os vendo loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril.

Oscar Wilde



 Helena Policarpo, António Soares e António Gil, leram TEMPO DE CINECLUBES
(extracto - autor desconhecido)




Em fins da década de cinquenta, recém-casados - eu com 28 anos e a Adelina com 21 - entrámos juntos para sócios do Cineclube Imagem, que frequentámos durante vários anos e onde tivemos
ocasião de assistir a filmes de grande qualidade e ler e ouvir críticas sobre tais filmes, sobre a sua estética e a estética do cinema em geral e, principalmente, a sua influência como veículo cultural por um lado, e instrumento de repressão por outro.
É evidente que o governo salazarista não morria de amores pelos cineclubes nem por quaisquer outras iniciativas que cheirassem a cultura, fora da rédea curta das suas próprias bafientas instituições. Não era Goebbels, um dos principais émulos da Alemanha nazi, que dizia que quando ouvia falar em cultura puxava logo da pistola?
Pois o Goebbels caricatural e provinciano cá do sítio, tudo fez para abafar os cineclubes logo à nascença. Só devido à pertinácia e coragem de alguns carolas, especialmente o Cineclube do Porto - o primeiro a aparecer em Portugal, em 1945, logo a seguir, portanto, à derrota do nazismo pelos aliados - o movimento cineclubista resistiu à repressão que sobre ele se abateu e, resistindo cresceu.

Quando a ele aderimos, já estava amplamente difundido em todo o território nacional, com clubes a funcionar em praticamente todas as cidades e algumas vilas. Em Lisboa, de  que eu tenha conhecimento (estou a escrever de memória e ao fluir da pena, sim, porque muito embora seja essa a realidade, não dá muito jeito dizer (“ao fluir do teclado”) havia, pelo menos, quatro: O Cineclube Imagem, o ABC- Cineclube, o Cineclube Católico, e o Cineclube Universitário.
Quem nos apresentou a ficha de inscrição foi o Vasco Granja. Lembram-se do homem que, sendo gago, falava pelos cotovelos, apresentando na RTP um programa de filmes de animação que faziam as delícias da garotada (e não só) e que foi um dos que mais tempo durou na história da Televisão Portuguesa? Faleceu em 2009.

Os filmes exibidos eram todos acompanhados de um caderno com a respectiva ficha técnica, biografia e filmografia do realizador e elaboradas críticas, onde se abordava a respectiva temática e estética, sempre do ponto de vista de interpretação marxista, clara ou encapotada, que os sócios, aos poucos iam aprendendo a descodificar.
Claro que a PIDE vigiava atentamente todas as actividades dos cineclubes e em especial ao Cineclube Imagem. Não será de estranhar pois que muitos de nós tenham sido presos. Assim aconteceu comigo, por exemplo. Ah, pois, não se julgue que o 25 de Abril aconteceu por acaso, porque uns tantos militares resolveram fazer um golpezito para se entreterem. O 25 de Abril aconteceu porque havia muita gente que durante os anos das trevas lutava para manter a chama acesa e criar as condições objectivas para que essas trevas se dissipassem.
Mas todo este preambulo acerca dos Cineclubes e que, sem contar, me fez alargar um pouco mais a conversa para falar de coisas que é sempre bom que não caiam no esquecimento, porque para as fazer esquecer já há muita e empenhada gente, este preambulo dizia, vem a propósito de um pequeno episódio que se passou connosco numa das sessões de cinema, julgo que no Capitólio.

Naquela tarde (as sessões, tinham lugar por volta das 19 horas, à saída dos empregos) o filme do programa era “Labirinto Infernal”, co-produção França/México, de 1956, realizado por Luis Buñuel.
Não era dos mais representativos do grande realizador espanhol, pois se fosse, a censura se encarregaria de obstar a que fosse visto cá em Portugal. Era um filme que, até certo ponto se poderia incluir no género de aventuras, mas o génio e o espírito iconoclasta de Buñuel lá estavam presentes, em pequenos apontamento como o episódio do padre queimando aos poucos as folhas do breviário, numa utilização pouco espiritual mas muito mais proveitosa naquele caso, do que rezar.

Acontece que, logo no princípio do filme, o “rapaz”, como então se dizia, passa com duas mulas carregadas de mercadorias por uma clareira onde um pelotão de soldados se prepara, de armas apontadas, para fuzilar uma fila de camponeses revoltosos postados na sua frente. Pois o nosso herói, com a calma e a audácia que lhe dá a certeza de aquilo ser tudo encenado para a câmara, como acontece com todas as fitas, atravessa impávido, à frente das mulas que puxa pela arreata, por entre as duas filas, de soldados de um lado e camponeses do outro.

Aí, o cabo do pelotão grita uma frase ameaçadora cujo teor exacto não me recordo, mas que seria mais ou menos “arreda, gringo de un cabrón, que te hodo nos cuernos !”
E o nosso homem, como resposta, limita-se a levantar o braço direito e com ele levantado, e fazendo ao mesmo tempo com os dedos aquela representação fálica que todos conhecemos, com o dedo médio erguido, a simular um pénis e o anelar e o indicador dobrados, configurando os indispensáveis “tintins” -representação em que os portugueses são mestres e que a maior parte do outros povos se limita a uma imitação pífia, sem nível, que se reduz apenas ao simples erguer de um único dedo - o nosso homem, dizia, que por acaso (e com isso ganhou de imediato a  minha simpatia) até fazia o gesto igualzinho ao nosso, continuou impávido e sereno, sem apressar o passo, sempre com o braço erguido, até sair da linha de fogo e prosseguir a sua olímpica caminhada.
Só depois se ouviu a descarga dos fusis e os camponeses caíram todos por terra, mortinhos da silva, sem um ai nem um estrebucho e o nosso homem, sem sequer virar a cabeça, lá seguiu até a câmara se esquecer dele e passar a outro plano.

À saída do cinema, a caminho do comboio e em busca do jantar, íamos comentando o filme, eu a salientar a excelência de umas cenas, e a Adelina a manifestar a sua preferência por outras.
“Só uma coisa não percebi”, diz-me ela a determinada altura,
“foi a razão daquela despropositada gargalhada geral, na cena de maior suspence, quando o homem passava em frente das espingardas prontas a disparar.”
É que, expliquei eu, o gesto que ele fez com os dedos constitui uma conhecida e popular representação fálica, que, naquelas circunstâncias, constituindo uma provocação, mais cómica se tornou.

“Ah, tornou a Adelina, só agora percebo porque é que a minha tia, sempre que - numa velha máquina de escrever que ela trouxe da América - eu escrevia apenas com o dedo médio de cada mão e com os outros encolhidos, porque isso me dava mais jeito, me batia sempre nas mãos e me dizia para não escrever assim.”
Não é uma ternura?

Epílogo:

Há dias, descendo a Avenida 25 de Abril, aqui em Almada, quatro ou cinco miúdas que não teriam mais de 14 ou 15 anos e que à minha frente caminhavam, vinham numa conversa tão desbragada, tão recheada de palavrões, que até o Bocage coraria de os ouvir…

Outros tempos, outros modos de estar.
Os palavrões não me incomodam, mas que o meu tempo era um tempo mais de causas, lá isso era.


No L.E.A. também há tempo para jogar.

















O Vasco trouxe o jogo "Quem é quem?", na versão L.E.A.
Composto por dois baralhos de cartas, o primeiro contem as descrições dos rostos de cada um.
(Cada pessoa foi autora da sua descrição)
O segundo, a foto da pessoa descrita.






Deitadas as cartas do jogo, coube ao grupo adivinhar quem era o colega descrito em cada carta, correspondendo às imagens do outro baralho.
















Não foi tarefa fácil.


































criatividade dos textos escondeu a evidência e o humor aguçou a curiosidade, ao desvendar de cada carta.